Autorias e Desencontros

Cortei o cabelo para ver se conseguia cortar outras coisas que estão me enrolando...

segunda-feira, 26 de outubro de 2009

"Quem tem medo do lobo-mau?"

Qual o sentido de me amar trancada no seu quarto?
Qual a graça de me amar segura dentro da sua casa?
E não vem dizer que não me ama!
Esse papo de que você não me ama já não cola!!!

Preciso entender como ainda acha que é possível
se proteger de qualquer coisa ameaçadora
que emerge nesse encontro de nós dois,
se desse tombo já caímos e sangramos?

Às vezes eu penso que a melhor forma de sobreviver
diante da porrada inevitável que virá
é relaxar o corpo...

Mas nem sonetizar sobre isso eu consigo:
como posso tentar argumentar?

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

Quanto vale o seu orgasmo? - Parte 2

Estava passando ao lado do Hospital na Cidade Universitária. Havia uma enorme poça que a água da chuva de ontem formou no asfalto desnivelado. A água parada estava suja, visivelmente negra. Um homem, dado o calor que o sol trazia, havendo nele a vontade de tomar um banho e a ausência de uma casa que pudesse lhe oferecer isso, usava aquela água imunda, lançava-a sobre suas costas com as mãos. Aproximadamente uns cem metros adiante passei por outro homem, que usando uma mangueira, conectada a alguma torneira de dentro do Hospital, lavava a sua van branca com a água fornecida pela sistema de abastecimento. A diferença entre o homem que tinha apenas aquela água imunda e a van que recebia límpida água, sabão e carinho é que nós dizemos que a van custa mais de 60 mil reais e que aquele homem não vale absolutamente nada.

Quanto vale o seu orgasmo? - Parte I

Estava atravessando a passarela na Linha Vermelha. Quando por um instante resolvi olhar o trânsito. Alguns policiais haviam parado o trafego, para que passassem dois pequenos caminhões, certamente portando alguma carga de muito valor, dinheiro talvez, armamento talvez... Enquanto isso, parado entre os tantos veículos, um motorista de uma ambulância aparentava desespero: com o trânsito parado as chances de que seu passageiro sobrevivesse diminuiam.

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Sobre o travesseiro

Uma noite ele dormiu com o travesseiro, e já na noite seguinte havia se tornado dificil dormir sem ele. Como seria possível ter passado tão rápido a depender de algo que de fato é dispensável na vida? A questão é que experimentou, e uma vez tendo experimentado aquela deliciosa sensação de conforto e aconchego, envolvido, entregue, imerso, provocada pelo travesseiro, dormir sem travesseiros havia se tornado tarefa difícil. Sim, não impossível, mas apenas difícil, que aliás era o que ele repetia constantemente para si mesmo. Se tantos anos vivera dormindo sem travesseiro algum, por que agora precisava de travesseiros? Sua inquietação aumentava profundamente na ausência do travesseiro. Revoltou-se então, não contra o fato de necessitar de travesseiros, mas com o travesseiro que provocou tal dependência nele. Entretanto, já era tarde demais: não apenas agora queria um travesseiro, desejava aquele travesseiro especificamente. O pior é que descobrir isso gerou nele inseguranças nunca antes sentidas, temia principalmente que o travesseiro não precisasse dele como ele dependia do travesseiro. E esse medo tornava-se certeza a cada noite em que o travesseiro não estava ao seu lado, mas nem assim conseguia desistir de querer o travesseiro.

Sobre o conto do mês passado

Eu sou Lenita
e seu rosto
repleto de cicatrizes.
Eu sou o homem
que a ama
apesar de tantas dúvidas.
Eu sou os especialistas
que querem
curá-la da sua dor,
e lucrarem na sua dor.
Eu sou o escritor
que afetado
escreve a estória.
Eu sou o conto escrito
para que você me ame.
E sou qualquer coisa inquieta...